quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Não vades ter com os gentios



8. Jesus enviou seus doze apóstolos, depois de lhes haver dado as instruções seguintes: Não procureis os gentios e não entreis nas cidades dos samaritanos. - Ide, antes, em busca das ovelhas perdidas da casa de Israel; - e, nos lugares onde fordes, pregai, dizendo que o reino dos céus está próximo. (S. MATEUS, cap. X, vv. 5 a 7.)
9. Em muitas circunstâncias, prova Jesus que suas vistas não se circunscrevem ao povo judeu, mas que abrangem a Humanidade toda. Se, portanto, diz a seus apóstolos que não vão ter com os pagãos, não é que desdenhe da conversão deles, o que nada teria de caridoso; é que os judeus, que já acreditavam no Deus uno e esperavam o Messias, estavam preparados, pela lei de Moisés e pelos profetas, a lhes acolherem a palavra. Com os pagãos, onde até mesmo a base faltava, estava tudo por fazer e os apóstolos não se achavam ainda bastante esclarecidos para tão pesada tarefa. Foi por isso que lhes disse: "Ide em busca das ovelhas transviadas de Israel", isto é, ide semear em terreno já arroteado. Sabia que a conversão dos gentios se daria a seu tempo. Mais tarde, com efeito, os apóstolos foram plantar a cruz no centro mesmo do Paganismo.
10. Essas palavras podem também aplicar-se aos adeptos e aos disseminados do Espiritismo. Os incrédulos sistemáticos, os zombadores obstinados, os adversários interessados são para eles o que eram os gentios para os apóstolos. Que, pois, a exemplo destes, procurem, primeiramente, fazer prosélitos entre os de boa vontade, entre os que desejam luz, nos quais um gérmen fecundo se encontra e cujo número é grande, sem
perderem tempo com os que não querem ver, nem ouvir e tanto mais resistem, por orgulho, quanto maior for a importância que se pareça ligar à sua conversão. Mais vale abrir os olhos a cem cegos que desejam ver claro, do que a um só que se compraza na treva, porque, assim procedendo, em maior proporção se aumentará o número dos sustentadores da causa. Deixar tranqüilos os outros não é dar mostra de indiferença, mas de boa política. Chegar-lhes-á a vez, quando estiverem dominados pela opinião geral e ouvirem a mesma coisa incessantemente repetida ao seu derredor. Aí, julgarão que aceitam voluntariamente, por impulso próprio, a idéia, e não por pressão de outrem. 
Depois, há idéias que são como as sementes: não podem germinar fora da estação apropriada, nem em terreno que não tenha sido de antemão preparado, pelo que melhor é se espere o tempo propício e se cultivem primeiro as que germinem, para não acontecer que abortem as outras, em virtude de um cultivo demasiado intenso.
Na época de Jesus e em conseqüência das idéias acanhadas e materiais então em curso, tudo se circunscrevia e localizava. A casa de Israel era um pequeno povo; os gentios eram outros pequenos povos circunvizinhos. Hoje, as idéias se universalizam e espiritualizam. A luz nova não constitui privilégio de nenhuma nação; para ela não existem barreiras, tem o seu foco em toda a parte e todos os homens são irmãos. Mas, também, os gentios já não são um povo, são apenas uma opinião com que se topa em toda parte e da qual a verdade triunfa pouco a pouco, como do Paganismo triunfou o Cristianismo. Já não são combatidos com armas de guerra, mas com a força da idéia.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Não vos afadigueis pela posse do ouro



9. Não vos afadigueis por possuir ouro, ou prata, ou qualquer outra moeda em vossos bolsos. - Não prepareis saco para a viagem, nem dois fatos, nem calçados, nem cajados, porquanto aquele que trabalha merece sustentado. 
10. Ao entrardes em qualquer cidade ou aldeia, procurai saber quem é digno de vos hospedar e ficai na sua casa até que partais de novo. - Entrando na casa, saudai-a assim: Que a paz seja nesta casa. Se a casa for digna disso, a vossa paz virá sobre ela; se não o for, a vossa paz voltará para vós.
Quando alguém não vos queira receber, nem escutar, sacudi, ao sairdes dessa casa ou cidade, a poeira dos vossos pés. - Digo-vos, em verdade: no dia do juízo, Sodoma e Gomorra serão tratadas menos rigorosamente do que essa cidade. (S. MATEUS, cap. X, vv. 9 a 15.)

11. Naquela época, nada tinham de estranhável essas palavras que Jesus dirigiu a seus apóstolos, quando os mandou, pela primeira vez, anunciar a boa-nova. Estavam de acordo com os costumes patriarcais do Oriente, onde o viajor encontrava sempre acolhida na tenda. Mas, então, os viajantes eram raros. Entre os povos modernos, o desenvolvimento da circulação houve de criar costumes novos. Os dos tempos antigos somente se conservam em países longínquos, onde ainda não penetrou o grande movimento. Se Jesus voltasse hoje, já
não poderia dizer a seus aposto-los: "Ponde-vos a caminho sem provisões."
A par do sentido próprio, essas palavras guardam um sentido moral muito profundo. Proferindo-as, ensinava Jesus a seus discípulos que confiassem na Providência. Ao demais, eles, nada tendo, não despertariam a cobiça nos que os recebessem. Era um meio de distinguirem dos egoístas os caridosos. Por isso foi que lhes disse: "Procurai saber quem é digno de vos hospedar" ou: quem é bastante humano para agasalhar o viajante que não tem com que pagar, porquanto esses são dignos de escutar as vossas palavras; pela caridade deles
é que os reconhecereis.
Quanto aos que não os quisessem receber, nem ouvir, recomendou ele porventura aos apóstolos que os amaldiçoassem, que se lhes impusessem, que usassem de violência e de constrangimento para os converterem? Não; mandou, pura e simplesmente, que se fossem embora, à procura de pessoas de boa vontade.
O mesmo diz hoje o Espiritismo a seus adeptos: não violenteis nenhuma consciência; a ninguém forceis para que deixe a sua crença, a fim de adotar a vossa; não anatematizeis os que não pensem como vós; acolhei os que venham ter convosco e deixai tranqüilos os que vos repelem. Lembrai-vos das palavras do Cristo. Outrora, o céu era tomado com violência; hoje o é pela brandura. (Cap. IV, nº 10 e 11.)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Ante o Natal



"625. Qual o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo?" "Jesus". O LIVRO DOS ESPÍRITOS
Considerando a alta significação do Natal em tua vida, podes ouvir e atender os apelos dos pequeninos esquecidos no grabato da orfandade ou relegados às palhas da miséria, em memória de Jesus quando menino; consegues compreender as dificuldades dos que caminham pela via da amargura, experimentando opróbrio e humilhação e dás-lhes a mão em gesto de solidariedade humana, recordando Jesus nos constantes testemunhos; abres os braços em socorro aos enfermos, estendendo-lhes o medicamento salutar ou o penso balsamizante, desejando diminuir a intensidade da dor, evocando Jesus entre os doentes que O buscavam, infelizes; ofereces entendimento aos que malograram moralmente e se escondem nos recantos do desprezo social, procurando-os para os levantar, reverenciando Jesus que jamais se furtou à misericórdia para os que os foram colhidos nas malhas da criminalidade, muitas vezes sob o jugo de obsessões cruéis; preparas a mesa, decoras o lar, inundas a família de alegrias e cercas os amigos de mimos e carinho pensando em Jesus, o Excelente Amigo de todos...
Tudo isto é Natal sem dúvida, como mensagem festiva que derrama bênçãos de consolo e amparo, espalhando na Terra as promessas de um Mundo Melhor, nos padrões estabelecidos por Jesus através das linhas mestras do amor.
Há, todavia, muitos outros corações junto aos quais deverias celebrar o Natal, firmando novos propósitos em homenagem a Jesus.
Companheiros que te dilaceraram a honra e se afastaram; amigos que se voltaram contra a tua afeição e se fizeram adversários; conhecidos caprichosos que exigiram alto tributo de amizade e avinagraram tuas alegrias; irmãos na fé que mudaram o conceito a teu respeito e atiraram espinhos por onde segues; colaboradores do teu ideal, que sem motivo se levantaram contra teu devotamento, criando dissensão e rebeldia ao teu lado; inimigos de ontem que se demoram inimigos hoje; difamadores que sempre constituíram dura provação. Todos eles são oportunidade para a celebração do Natal pelo teu sentimento cristão e espírita.
Esquece os males que te fizeram e pede-lhes te perdoem as dificuldades que certamente também lhes impuseste.
Dirige-lhes um cartão colorido para esmaecer o negrume da aversão que os manteve em silêncio e à distância nos quais, talvez, inconscientemente te comprazes.
Provavelmente alguns até gostariam de reatar liames... Dá-lhes esta oportunidade por amor a Jesus, que a todo instante, embora conhecendo os inimigos os amou sem cansaço, oferecendo-lhes ensejos de recuperação.
O Natal é dádiva do Céu à Terra como ocasião de refazer e recomeçar.
Detém-te a contemplar as criaturas que passam apressadas. Se tiveres olhos de ver percebê-las-ás tristes, sucumbidas, como se carregassem pesados fardos, apesar de exibirem tecidos custosos e aparência cuidada. Explodem facilmente, transfigurando a face e deixando-se consumir pela cólera que as vence implacavelmente.
Todas desejam compreensão e amor, entendimento e perdão, sem coragem de ser quem compreenda ou ame, entenda ou perdoe.
Espalha uma nova claridade neste Natal, na senda por onde avanças na busca da Vida.
Engrandece-te nas pequenas doações, crescendo nos deveres que poucos se propõem executar. Desde que já podes dar os valores amoedados e as contribuições do entendimento moral, distribui, também, as jóias sublimes do perdão aos que te fizeram ou fazem sofrer.
Sentirás que Jesus, escolhendo um humílimo refúgio para viver entre os homens semeando alegrias incomparáveis, nasce, agora, no teu coração como a informar-te que todo dia é natal para quem o ama e deseja transformar-se em carta-viva para anunciá-lo às criaturas desatentas e sofredoras do mundo.
Somente assim ouvirás no imo d’alma e entenderás a saudação inesquecível dos anjos, na noite excelsa:
"Glória a Deus nas alturas, paz na terra, boa vontade, para com os homens" - vivendo um perene natal de bênçãos por amor a Jesus.
Franco, Divaldo Pereira. Da obra: Espírito e Vida. Ditado pelo Espírito Joanna de Ângelis. Capítulo 60. LEAL Editora

Missão dos profetas



4. Atribui-se comumente aos profetas o dom de adivinhar o futuro, de sorte que as palavras profecia e predição se tornaram sinônimas. No sentido evangélico, o vocábulo profeta tem mais extensa significação. Diz-se de todo enviado de Deus com a missão de instruir os homens e de lhes revelar as coisas ocultas e os mistérios da vida espiritual. Pode, pois, um homem ser profeta, sem fazer predições. Aquela era a idéia dos judeus, ao tempo de Jesus. Daí vem que, quando o levaram à presença do sumo-sacerdote Caifás, os escribas e os anciães, reunidos, lhe cuspiram no rosto, lhe deram socos e bofetadas, dizendo: "Cristo, profetiza para nós e dize quem foi que te bateu." Entretanto, deu-se o caso de haver profetas que tiveram a presciência do futura, quer por intuição, quer por providencial revelação, a fim de transmitirem avisos aos homens. Tendo-se realizado os acontecimentos preditos, o dom de predizer o futuro foi considerado como um dos atributos da qualidade de profeta.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Missão do homem inteligente na Terra


13. Não vos ensoberbais do que sabeis, porquanto esse saber tem limites muito estreitos no mundo em que habitais. Suponhamos sejais sumidades em inteligência neste planeta: nenhum direito tendes de envaidecer-vos. Se Deus, em seus desígnios, vos fez nascer num meio onde pudestes desenvolver a vossa inteligência, é que quer a utilizeis para o bem de todos; é uma missão que vos dá, pondo-vos nas mãos o instrumento com que podeis desenvolver, por vossa vez, as inteligências retardatárias e conduzi-las a ele. A natureza do instrumento não está a indicar a que utilização deve prestar-se? A enxada que o jardineiro entrega a seu ajudante não mostra a este último que lhe cumpre cavar a terra? Que diríeis, se esse ajudante, em vez de trabalhar, erguesse a enxada para ferir o seu patrão? Diríeis que é horrível e que ele merece expulso. Pois bem: não se dá o mesmo com aquele que se serve da sua inteligência para destruir a idéia de Deus e da Providência entre seus irmãos? Não levanta ele contra o seu senhor a enxada que lhe foi confiada para arrotear o terreno? Tem ele direito ao salário prometido? Não merece, ao contrário, ser expulso do jardim? Sê-lo-á, não duvideis, e atravessará existências miseráveis e cheias de humilhações, até que se curve diante d'Aquele a quem tudo deve.
A inteligência é rica de méritos para o futuro, mas, sob a condição de ser bem empregada. Se todos os homens que a possuem dela se servissem de conformidade com a vontade de Deus, fácil seria, para os Espíritos, a tarefa de fazer que a Humanidade avance. Infelizmente, muitos a tomam instrumento de orgulho e de perdição contra si mesmos. O homem abusa da inteligência como de todas as suas outras faculdades e, no entanto, não lhe faltam ensinamentos que o advirtam de que uma poderosa mão pode retirar o que lhe concedeu. - Ferdinando, Espírito protetor. (Bordéus, 1862.)

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Preservar-se da avareza



3. Então, no meia do turba, um homem lhe disse: Mestre, dize a meu irmão que divida comigo a herança que nos tocou. - Jesus lhe disse: Ó homem! quem me designou para vos julgar, ou para fazer as vossas partilhas? - E acrescentou: Tende o cuidado de preservar-vos de toda a avareza, seja qual for a abundância em que o homem se encontre, sua vida não depende dos bens que ele possua.
Disse-lhes a seguir esta parábola: Havia um rico homem cujas terras tinham produzido extraordinariamente - e que se entretinha a pensar consigo mesmo, assim: Que hei de fazer, pois já não tenho lugar onde possa encerrar tudo o que vou colher? - Aqui está, disse, o que farei: Demolirei os meus celeiros e construirei outros maiores, onde porei toda a minha colheita e todos os meus bens. - E direi a minha alma: Minha alma, tens de reserva muitos bens para longos anos; repousa, come, bebe, goza. Mas, Deus, ao mesmo tempo, disse ao homem: Que insensato és! Esta noite mesmo tomar-te-ão a alma; para que servirá o que acumulaste?
É o que acontece àquele que acumula tesouros para si próprio e que não é rico diante de Deus. (S. LUCAS, cap. XII, vv. 13 a 21.)

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A beneficência



11. A beneficência, meus amigos, dar-vos-á nesse mundo os mais puros e suaves deleites, as alegrias do coração, que nem o remorso, nem a indiferença perturbam. Oh! pudésseis compreender tudo o que de grande e de agradável encerra a generosidade das almas belas, sentimento que faz olhe a criatura as outras como olha a si mesma, e se dispa, jubilosa, para vestir o seu irmão! Pudésseis, meus amigos, ter por única ocupação tornar felizes os outros! Quais as festas mundanas que podereis comparar às que celebrais quando, como
representantes da Divindade, levais a alegria a essas famílias que da vida apenas conhecem as vicissitudes e as amarguras, quando vedes nelas os semblantes macerados refulgirem subitamente de esperança, porque, faltos de pão, os desgraçados ouviam seus filhinhos, ignorantes de que viver é sofrer, gritando repetidamente, a chorar, estas palavras, que, como agudo punhal, se lhes enterravam nos corações maternos: "Estou com fome!..." Oh! compreendei quão deliciosas são as impressões que recebe aquele que vê renascer a alegria
onde, um momento antes, só havia desespero! Compreendei as obrigações que tendes para com os vossos irmãos! Ide, ide ao encontro do infortúnio; ide em socorro, sobretudo, das misérias ocultas, por serem as mais dolorosas! Ide, meus bem-amados, e tende em mente estas palavras do Salvador: "Quando vestirdes a um destes pequeninos, lembrai-vos de que é a mim que o fazeis!"
Caridade! sublime palavra que sintetiza todas as virtudes, és tu que hás de conduzir os povos à felicidade. Praticando-te, criarão eles para si infinitos gozos no futuro e, enquanto se acharem exilados na Terra, tu lhes serás a consolação, o prelibar das alegrias de que fruirão mais tarde, quando se encontrarem reunidos no seio do Deus de amor. Foste tu, virtude divina, que me proporcionaste os únicos momentos de satisfação de que gozei na Terra. Que os meus irmãos encarnados creiam na palavra do amigo que lhes fala, dizendo-lhes: E na caridade que deveis procurar a paz do coração, o contentamento da alma, o remédio para as aflições da vida. Oh! quando estiverdes a ponto de acusar a Deus, lançai um olhar para baixo de vós; vede que de misérias a aliviar, que de pobres crianças sem família, que de velhos sem qualquer mão amiga que os ampare e lhes feche os olhos quando a morte os reclame! Quanto bem a fazer! Oh! não vos queixeis; ao contrário, agradecei a Deus e prodigalizai a mancheias a vossa simpatia, o vosso amor, o vosso dinheiro por todos os que, deserdados dos bens desse mundo, enlanguescem na dor e no insulamento! Colhereis nesse mundo bem doces alegrias e, mais tarde... só Deus o sabe!... Adolfo, bispo de Argel. (Bordéus, 1861.)

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Desigualdade das riquezas



8. A desigualdade das riquezas é um dos problemas que inutilmente se procurará resolver, desde que se considere apenas a vida atual. A primeira questão que se apresenta é esta: Por que não são igualmente ricos todos os homens? Não o são por uma razão muito simples: por não serem igualmente inteligentes, ativos e laboriosos para adquirir, nem sóbrios e previdentes para conservar. E, alias, ponto matematicamente demonstrado que a riqueza, repartida com igualdade, a cada um daria uma parcela mínima e insuficiente; que, supondo efetuada essa repartição, o equilíbrio em pouco tempo estaria desfeito, pela diversidade dos caracteres e das aptidões; que, supondo-a possível e durável, tendo cada um somente com que viver, o resultado seria o aniquilamento de todos os grandes trabalhos que concorrem para o progresso e para o bem-estar da Humanidade; que, admitido desse ela a cada um o necessário, já não haveria o aguilhão que impele os homens às grandes descobertas e aos empreendimentos úteis. Se Deus a concentra em certos pontos, é para que daí se expanda em quantidade suficiente, de acordo com as necessidades.
Admitido isso, pergunta-se por que Deus a concede a pessoas incapazes de fazê-la frutificar para o bem de todos. Ainda aí está uma prova da sabedoria e da bondade de Deus. Dando-lhe o livre-arbítrio, quis ele que o homem chegasse, por experiência própria, a distinguir o bem do mal e que a prática do primeiro resultasse de seus esforços e da sua vontade. Não deve o homem ser conduzido fatalmente ao bem, nem ao mal, sem o que não mais fora senão instrumento passivo e irresponsável como os animais. A riqueza é um meio de o experimentar moralmente. Mas, como, ao mesmo tempo, é poderoso meio de ação para o progresso, não quer Deus que ela permaneça longo tempo improdutiva, pelo que incessantemente a desloca. Cada um tem de possuí-la, para se exercitar em utilizá-la e demonstrar que uso sabe fazer dela. Sendo, no entanto, materialmente impossível que todos a possuam ao mesmo tempo, e acontecendo, além disso, que, se todos a possuíssem, ninguém trabalharia, com o que o melhoramento do planeta ficaria comprometido, cada um a possui por sua vez. Assim, um que não na tem hoje, já a teve ou terá noutra existência; outro, que agora a tem, talvez não na tenha amanhã. Há ricos e pobres, porque sendo Deus justo, como é, a cada um prescreve trabalhar a seu turno. A pobreza é, para os que a sofrem, a prova da paciência e da resignação; a riqueza é, para os outros, a prova da caridade e da abnegação.
Deploram-se, com razão, o péssimo uso que alguns fazem das suas riquezas, as ignóbeis paixões que a cobiça provoca, e pergunta-se: Deus será justo, dando-as a tais criaturas? E exato que, se o homem só tivesse uma única existência, nada justificaria semelhante repartição dos bens da Terra; se, entretanto, não tivermos em vista apenas a vida atual e, ao contrário, considerarmos o conjunto das existências, veremos que tudo se equilibra com justiça. Carece, pois, o pobre de motivo assim para acusar a Providência, como para invejar os ricos e estes para se glorificarem do que possuem. Se abusam, não será com decretos ou leis suntuárias que se remediará o mal. As leis podem, de momento, mudar o exterior, mas não logram mudar o coração; daí vem serem elas de duração efêmera e quase sempre seguidas de uma reação mais desenfreada. A origem do mal reside no egoísmo e no orgulho: os abusos de toda espécie cessarão quando os homens se regerem pela lei da caridade.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Eis seus momentos de luz...



Se você está feliz, ore sempre, rogando ao Senhor para que o equilíbrio esteja em seus passos. 
Se você sofre, ore para que não lhe falte compreensão e paciência.
Se você está no caminho certo, ore para que não se desvie.
Se você está de espírito marginalizado, sob o risco de queda em despenhadeiros ou perigosos declives, ore para que o seu raciocínio retome a senda justa.
Se você está doente, ore a fim de que a saúde possível lhe seja restituída.
Se você tem o corpo robusto, ore para que as suas forças não se percam.
Se você está trabalhando, ore pedindo a Deus lhe conserve a existência no privilégio de servir.
Se você permanece ausente da atividade, ore, solicitando aos Mensageiros do Senhor lhe auxiliem a encontrar ou reencontrar a felicidade da ação para o bem
Se você já aprendeu a perdoar as ofensas, ore para que prossiga cultivando semelhante atitude.
Se você reprova ou condena alguém, ore rogando à Divina Providência lhe ajude a entender o que faríamos nós se estivéssemos no lugar de quem caiu ou de quem errou, de modo a aprendermos discernimento e tolerância.
Se você possui conhecimentos superiores, ore para que não lhe falte a disposição de trabalhar, a fim de transmití-los a outrem, sem qualquer idéia de superioridade, reconhecendo que a luz de sua inteligência vem de Deus que no-la concede para que venhamos a fazer o melhor de nosso tempo e de nossa vida, entregando-nos, porém, à responsabilidade de nossos próprios atos.
Se você ainda ignora as verdades da vida, ore para que o seu espírito consiga assimilar as lições que o Mais Alto lhe envia.
Ore sempre.
A oração é o momento de luz, nas obscuridades e provas do caminho de aperfeiçoamento em que ainda nos achamos, para o nosso encontro íntimo com o amparo de Deus.
André Luiz  
Mensagem "Momentos de Luz"
(Do livro “Tempo de Luz”, André Luiz, Francisco Cândido Xavier, Espíritos Diversos)

Fora da caridade não há salvação



10. Meus filhos, na máxima: Fora da caridade não há salvação, estão encerrados os destinos dos homens, na Terra e no céu; na Terra, porque à sombra desse estandarte eles viverão em paz; no céu, porque os que a houverem praticado acharão graças diante do Senhor. Essa divisa é o facho celeste, a luminosa coluna que guia o homem no deserto da vida, encaminhando-o para a Terra da Promissão. Ela brilha no céu, como auréola santa, na fronte dos eleitos, e, na Terra, se acha gravada no coração daqueles a quem Jesus dirá: Passai à direita, benditos de meu Pai. Reconhecê-los-eis pelo perfume de caridade que espalham em torno de si Nada exprime com mais exatidão o pensamento de Jesus, nada resume tão bem os deveres do homem, como essa máxima de ordem divina. Não poderia o Espiritismo provar melhor a sua origem, do que apresentando-a como regra, por isso que é um reflexo do mais puro Cristianismo. Levando-a por guia, nunca o homem se transviará. Dedicai-vos, assim, meus amigos, a perscrutar-lhe o sentido profundo e as conseqüências, a descobrir-lhe, por vós mesmos, todas as aplicações. Submetei todas as vossas ações ao governo da caridade e a consciência vos responderá. Não só ela evitará que pratiqueis o mal, como também fará que pratiqueis o bem, porquanto uma virtude negativa não basta: é necessária uma virtude ativa.
Para fazer-se o bem, mister sempre se torna a ação da vontade; para se não praticar o mal, basta as mais das vezes a inércia e a despreocupação. Meus amigos, agradecei a Deus o haver permitido que pudésseis gozar a luz do Espiritismo. Não é que somente os que a possuem hajam de ser salvos; é que, ajudando-vos a compreender os ensinos do Cristo, ela vos faz melhores cristãos. Esforçai-vos, pois, para que os vossos irmãos, observando-vos, sejam induzidos a reconhecer que verdadeiro espírita e verdadeiro cristão são uma só e a mesma coisa, dado que todos quantos praticam a caridade são discípulos de Jesus, sem embargo da seita a que pertençam. Paulo, o apóstolo. (Paris, 1860.)

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Bem-aventurados os que têm fechados os olhos (1)



20. Meus bons amigos, para que me chamastes? Terá sido para que eu imponha as mãos sobre a pobre sofredora que está aqui e a cure? Ah! que sofrimento, bom Deus! Ela perdeu a vista e as trevas a envolveram. Pobre filha! Que ore e espere. Não sei fazer milagres, eu, sem que Deus o queira. Todas as curas que tenho podido obter e que vos foram assinaladas não as atribuais senão àquele que é o Pai de todos nós. Nas vossas aflições, volvei sempre para o céu o olhar e dizei do fundo do coração: "Meu Pai, cura-me, mas faze que minha alma enferma se cure antes que o meu corpo; que a minha carne seja castigada, se necessário, para que minha alma se eleve ao teu seio, com a brancura que possuía quando a criaste." Após essa prece, meus amigos, que o bom Deus ouvirá sempre, dadas vos serão a força e a coragem e, quiçá, também a cura que apenas timidamente pedistes, em recompensa da vossa abnegação.
Contudo, uma vez que aqui me acho, numa assembléia onde principalmente se trata de estudos, dir-vos-ei que os que são privados da vista deveriam considerar-se os bem-aventurados da expiação. Lembrai-vos de que o Cristo disse convir que arrancásseis o vosso olho se fosse mau, e que mais valeria lançá-lo ao fogo, do que deixar se tornasse causa da vossa condenação. Ah! quantos há no mundo que um dia, nas trevas, maldirão o terem visto a luz! Oh! sim, como são felizes os que, por expiação, vêm a ser atingidos na vista! Os olhos não lhes serão causa de escândalo e de queda; podem viver inteiramente da vida das almas; podem ver mais do que vós que tendes límpida a visão!... Quando Deus me permite descerrar as pálpebras a algum desses pobres sofredores e lhes restituir a luz, digo a mim mesmo: Alma querida, por que não
conheces todas as delicias do Espírito que vive de contemplação e de amor? Não pedirias, então, que se te concedesse ver imagens menos puras e menos suaves, do que as que te é dado entrever na tua cegueira!
Oh! bem-aventurado o cego que quer viver com Deus. Mais ditoso do que vós que aqui estais, ele sente a felicidade, toca-a, vê as almas e pode alçar-se com elas às esferas espirituais que nem mesmo os predestinados da Terra logram divisar. Abertos, os olhos estão sempre prontos a causar a falência da alma; fechados, estão prontos sempre, ao contrário, a fazê-la subir para Deus. Crede-me, bons e caros amigos, a cegueira dos olhos é, muitas vezes, a verdadeira luz do coração, ao passo que a vista é, com freqüência, o anjo tenebroso que conduz à morte.
Agora, algumas palavras dirigidas a ti, minha pobre sofredora. Espera e tem ânimo! Se eu te dissesse: Minha filha, teus olhos vão abrir-se, quão jubilosa te sentirias! Mas, quem sabe se esse júbilo não ocasionaria a tua perda! Confia no bom Deus, que fez a ventura e permite a tristeza. Farei tudo o que me for consentido a teu favor; mas, a teu turno, ora e, ainda mais, pensa em tudo quanto acabo de te dizer.
Antes que me vá, recebei todos vós, que aqui vos achais reunidos, a minha bênção. - Vianney, cura d'Ars. (Paris, 1863.)

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(1) Esta comunicação foi dada com relação a uma pessoa cega, a cujo favor se evocara o Espírito de J. B. Vianney, cura d’Ars.


21. NOTA. Quando uma aflição não é conseqüência dos atos da vida presente, devese-lhe buscar a causa numa vida anterior. Tudo aquilo a que se dá o nome de caprichos da sorte mais não é do que efeito da justiça de Deus, que não inflige punições arbitrárias pois quer que a pena esteja sempre em correlação com a falta. Se, por sua bondade, lançou um véu sobre os nossos atos passados, por outro lado nos aponta o caminho, dizendo: '“Quem matou à espada, pela espada perecerá", palavras que se podem traduzir assim: "A criatura é sempre punida por aquilo em que pecou." Se, portanto, alguém sofre o tormento da perda da vista, é que esta lhe foi causa de queda. Talvez tenha sido também causa de que outro perdesse a vista; de que alguém haja perdido a vista em conseqüência do excesso de trabalho que aquele lhe impôs, ou de maus-tratos, de falta de cuidados, etc. Nesse caso, passa ele pela pena de talião. É possível que ele próprio, tomado de arrependimento, haja escolhido essa expiação, aplicando a si estas palavras de Jesus: "Se o teu olho for motivo de escândalo, arranca-o." 

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Progressão dos mundos



19. O progresso é lei da Natureza. A essa lei todos os seres da Criação, animados e inanimados, foram submetidos pela bondade de Deus, que quer que tudo se engrandeça e prospere. A própria destruição, que aos homens parece o termo final de todas as coisas, é apenas uni meio de se chegar, pela transformação, a um estado mais perfeito, visto que tudo morre para renascer e nada sofre o aniquilamento.
Ao mesmo tempo que todos os seres vivos progridem moralmente, progridem materialmente os mundos em que eles habitam. Quem pudesse acompanhar um mundo em suas diferentes fases, desde o instante em que se aglomeraram os primeiros átomos destinados e constituí-lo, vê-lo-ia a percorrer uma escala incessantemente progressiva, mas de degraus imperceptíveis para cada geração, e a oferecer aos seus habitantes uma morada cada vez mais agradável, à medida que eles próprios avançam na senda do progresso. Marcham assim, paralelamente, o progresso do homem, o dos animais, seus auxiliares, o dos vegetais e o da habitação, porquanto nada em a Natureza permanece estacionário. Quão grandiosa é essa idéia e digna da majestade do Criador! Quanto, ao contrário, é mesquinha e indigna do seu poder a que concentra a sua solicitude e a sua providência no imperceptível grão de areia, que é a Terra, e restringe a Humanidade aos poucos homens que a habitam!
Segundo aquela lei, este mundo esteve material e moralmente num estado inferior ao em que hoje se acha e se alçará sob esse duplo aspecto a um grau mais elevado. Ele há chegado a um dos seus períodos de transformação, em que, de orbe expiatório, mudar-se-á em planeta de regeneração, onde os homens serão ditosos, porque nele imperará a lei de Deus. - Santo Agostinho. (Paris, 1862.)

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A fé humana e a divina



12. No homem, a fé é o sentimento inato de seus destinos futuros; é a consciência que ele tem das faculdades imensas depositadas em gérmen no seu íntimo, a princípio em estado latente, e que lhe cumpre fazer que desabrochem e cresçam pela ação da sua vontade.
Até ao presente, a fé não foi compreendida senão pelo lado religioso, porque o Cristo a exalçou como poderosa alavanca e porque o têm considerado apenas como chefe de uma religião. Entretanto, o Cristo, que operou milagres materiais, mostrou, por esses milagres mesmos, o que pode o homem, quando tem fé, isto é, a vontade de querer e a certeza de que essa vontade pode obter satisfação. Também os apóstolos não operaram milagres, seguindo-lhe o exemplo? Ora, que eram esses milagres, senão efeitos naturais, cujas causas os homens de então desconheciam, mas que, hoje, em grande parte se explicam e que pelo estudo do Espiritismo e do Magnetismo se tornarão completamente compreensíveis?
A fé é humana ou divina, conforme o homem aplica suas faculdades à satisfação das necessidades terrenas, ou das suas aspirações celestiais e futuras. O homem de gênio, que se lança à realização de algum grande empreendimento, triunfa, se tem fé, porque sente em si que pode e há de chegar ao fim colimado, certeza que lhe faculta imensa força. O homem de bem que, crente em seu futuro celeste, deseja encher de belas e nobres ações a sua existência, haure na sua fé, na certeza da felicidade que o espera,a força necessária, e ainda aí se operam milagres de caridade, de devotamento e de abnegação. Enfim, com a fé, não há maus pendures que se não chegue a vencer. 
O Magnetismo é uma das maiores provas do poder da fé posta em ação. É pela fé que ele cura e produz esses fenômenos singulares, qualificados outrora de milagres. Repito: a fé é humana e divina. Se todos os encarnados se achassem bem persuadidos da força que em si trazem, e se quisessem pôr a vontade a serviço dessa força, seriam capazes de realizar o a que, até hoje, eles chamaram prodígios e que, no entanto, não passa de um desenvolvimento das faculdades humanas. Um Espírito Protetor. (Paris, l863.)

domingo, 6 de novembro de 2011

O óbolo da viúva



5. Estando Jesus sentado defronte do gazofilácio, a observar de que modo o povo lançava ali o dinheiro, viu que muitas pessoas ricas o deitavam em abundância. - Nisso, veio também uma pobre que apenas deitou duas pequenas moedas do valor de dez centavos cada uma. - Chamando então seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deu muito mais do que todos os que antes puseram suas dádivas no gazofilácio; - por isso que todos os outros deram do que lhes abunda, ao passo que ela deu do que lhe faz falta, deu mesmo tudo o que tinha para seu sustento. (SÃO MARCOS, cap. XII, vv. 41 a 44. - S. LUCAS, cap. XXI. vv. 1 a 4.)

6. Multa gente deplora não poder fazer todo o bem que desejara, por falta de recursos suficientes, e, se desejam possuir riquezas, é, dizem, para lhes dar boa aplicação. E sem dúvida louvável a intenção e pode até nalguns ser sincera. Dar-se-á, contudo, seja completamente desinteressada em todos? Não haverá quem, desejando fazer bem aos outros, muito estimaria poder começar por fazê-lo a si próprio, por proporcionar a si mesmo alguns gozos mais, por usufruir de um pouco do supérfluo que lhe falta, pronto a dar aos pobres o resto? Esta segunda intenção, que esses tais porventura dissimulam aos seus próprios olhos, mas que se lhes depararia no fundo dos seus corações, se eles os perscrutassem, anula o mérito do intento, visto que, com a verdadeira caridade, o homem pensa nos outros antes de pensar em si. O ponto sublimado da caridade, nesse caso, estaria em procurar ele no seu trabalho, pelo emprego de suas forças, de sua inteligência, de seus talentos, os recursos de que carece para realizar seus generosos propósitos. Haveria nisso o sacrifício que mais agrada ao Senhor infelizmente, a maioria vive a sonhar com os meios de mais facilmente se enriquecer de súbito e sem esforço, correndo atrás de quimeras, quais a descoberta de tesouros, de uma favorável ensancha aleatória, do recebimento de inesperadas heranças, etc. Que dizer dos que esperam encontrar nos Espíritos auxiliares que os secundem na consecução de tais objetivos? Certamente não conhecem, nem compreendem a sagrada finalidade do Espiritismo e, ainda menos, a missão dos Espíritos a quem Deus permite se comuniquem com os homens. Daí vem o serem punidos pelas decepções. (O Livro dos Médiuns, 2ª Parte, nº 294 e nº 295.)
Aqueles cuja intenção está isenta de qualquer idéia pessoal, devem consolar-se da impossibilidade em que se vêem de fazer todo o bem que desejariam, lembrando-se de que o óbolo do pobre, do que dá privando-se do necessário, pesa mais na balança de Deus do que o ouro do rico que dá sem se privar de coisa alguma. Grande seria realmente a satisfação do primeiro, se pudesse socorrer, em larga escala, a indigência; mas, se essa satisfação lhe é negada, submeta-se e se limite a fazer o que possa. Aliás, será só com o dinheiro que se
podem secar lágrimas e dever-se-á ficar inativo, desde que se não tenha dinheiro? Todo aquele que sinceramente deseja ser útil a seus irmãos, mil ocasiões encontrará de realizar o seu desejo. Procure-as e elas se lhe depararão; se não for de um modo, será de outro, porque ninguém há que, no pleno gozo de suas faculdades, não possa prestar um serviço qualquer, prodigalizar um consolo, minorar um sofrimento físico ou moral, fazer um esforço útil. Não dispõem todos, à falta de dinheiro, do seu trabalho, do seu tempo, do seu repouso, para de tudo isso dar uma parte ao próximo? Também aí está a dádiva do pobre, o óbolo da viúva.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

O homem de bem



3. O verdadeiro homem de bem é o que cumpre a lei de justiça, de amor e de caridade, na sua maior pureza. Se ele interroga a consciência sobre seus próprios atos, a si mesmo perguntará se violou essa lei, se não praticou o mal, se fez todo o bem que podia, se desprezou voluntariamente alguma ocasião de ser útil, se ninguém tem qualquer queixa dele; enfim, se fez a outrem tudo o que desejara lhe fizessem.
Deposita fé em Deus, na Sua bondade, na Sua justiça e na Sua sabedoria. Sabe que sem a Sua permissão nada acontece e se Lhe submete à vontade em todas as coisas.
Tem fé no futuro, razão por que coloca os bens espirituais acima dos bens temporais.
Sabe que todas as vicissitudes da vida, todas as dores, todas as decepções são provas ou expiações e as aceita sem murmurar.
Possuído do sentimento de caridade e de amor ao próximo, faz o bem pelo bem, sem esperar paga alguma; retribui o mal com o bem, toma a defesa do fraco contra o forte, e sacrifica sempre seus interesses à justiça.
Encontra satisfação nos benefícios que espalha, nos serviços que presta, no fazer ditosos os outros, nas lágrimas que enxuga, nas consolações que prodigaliza aos aflitos. Seu primeiro impulso é para pensar nos outros, antes de pensar em si, é para cuidar dos interesses dos outros antes do seu próprio interesse. O egoísta, ao contrário, calcula os proventos e as perdas decorrentes de toda ação generosa.
O homem de bem é bom, humano e benevolente para com todos, sem distinção de raças, nem de crenças, porque em todos os homens vê irmãos seus.
Respeita nos outros todas as convicções sinceras e não lança anátema aos que como ele não pensam.
Em todas as circunstâncias, toma por guia a caridade, tendo como certo que aquele que prejudica a outrem com palavras malévolas, que fere com o seu orgulho e o seu desprezo a suscetibilidade de alguém, que não recua à idéia de causar um sofrimento, uma contrariedade, ainda que ligeira, quando a pode evitar, falta ao dever de amar o próximo e não merece a clemência do Senhor.
Não alimenta ódio, nem rancor, nem desejo de vingança; a exemplo de Jesus, perdoa e esquece as ofensas e só dos benefícios se lembra, por saber que perdoado lhe será conforme houver perdoado.
É indulgente para as fraquezas alheias, porque sabe que também necessita de indulgência e tem presente esta sentença do Cristo: "Atire-lhe a primeira pedra aquele que se achar sem pecado."
Nunca se compraz em rebuscar os defeitos alheios, nem, ainda, em evidenciá-los. Se a isso se vê obrigado, procura sempre o bem que possa atenuar o mal.
Estuda suas próprias imperfeições e trabalha incessantemente em combatê-las. Todos os esforços emprega para poder dizer, no dia seguinte, que alguma coisa traz em si de melhor do que na véspera.
Não procura dar valor ao seu espírito, nem aos seus talentos, a expensas de outrem; aproveita, ao revés, todas as ocasiões para fazer ressaltar o que seja proveitoso aos outros.
Não se envaidece da sua riqueza, nem de suas vantagens pessoais, por saber que tudo o que lhe foi dado pode ser-lhe tirado.
Usa, mas não abusa dos bens que lhe são concedidos, porque sabe que é um depósito de que terá de prestar contas e que o mais prejudicial emprego que lhe pode dar é o de aplicá-lo à satisfação de suas paixões.
Se a ordem social colocou sob o seu mando outros homens, trata-os com bondade e benevolência, porque são seus iguais perante Deus; usa da sua autoridade para lhes levantar o moral e não para os esmagar com o seu orgulho. Evita tudo quanto lhes possa tornar mais penosa a posição subalterna em que se encontram.
O subordinado, de sua parte, compreende os deveres da posição que ocupa e se empenha em cumpri-los conscienciosamente. (Cap. XVII, nº 9.)
Finalmente, o homem de bem respeita todos os direitos que aos seus semelhantes dão as leis da Natureza, como quer que sejam respeitados os seus. 
Não ficam assim enumeradas todas as qualidades que distinguem o homem de bem; mas, aquele que se esforce por possuir as que acabamos de mencionar, no caminho se acha que a todas as demais conduz.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A melancolia



25. Sabeis por que, às vezes, uma vaga tristeza se apodera dos vossos corações e vos leva a considerar amarga a vida? E que vosso Espírito, aspirando à felicidade e à liberdade, se esgota, jungido ao corpo que lhe serve de prisão, em vãos esforços para sair dele.
Reconhecendo inúteis esses esforços, cai no desânimo e, como o corpo lhe sofre a influência, toma-vos a lassidão, o abatimento, uma espécie de apatia, e vos julgais infelizes. 
Crede-me, resisti com energia a essas impressões que vos enfraquecem a vontade. São inatas no espírito de todos os homens as aspirações por uma vida melhor; mas, não as busqueis neste mundo e, agora, quando Deus vos envia os Espíritos que lhe pertencem, para vos instruírem acerca da felicidade que Ele vos reserva, aguardai pacientemente o anjo da libertação, para vos ajudar a romper os liames que vos mantêm cativo o Espírito. Lembrai-vos de que, durante o vosso degredo na Terra, tendes de desempenhar uma missão de que não suspeitais, quer dedicando-vos à vossa família, quer cumprindo as diversas obrigações que Deus vos confiou. Se, no curso desse degredo-provação, exonerando-vos dos vossos encargos, sobre vós desabarem os cuidados, as inquietações e tribulações, sede fortes e corajosos para os suportar. Afrontai-os resolutos. Duram pouco e vos conduzirão à companhia dos amigos por quem chorais e que, jubilosos por ver-vos de novo entre eles, vos estenderão os braços, a fim de guiar-vos a uma região inacessível às aflições da Terra. -
François de Genève. (Bordéus.)

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Perdão das ofensas



14. Quantas vezes perdoarei a meu irmão? Perdoar-lhe-eis, não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes. Aí tendes um dos ensinos de Jesus que mais vos devem percutir a inteligência e mais alto falar ao coração. Confrontai essas palavras de misericórdia com a oração tão simples, tão resumida e tão grande em suas aspirações, que ensinou a seus discípulos, e o mesmo pensamento se vos deparará sempre. Ele, o justo por excelência, responde a Pedro: perdoarás, mas ilimitadamente; perdoarás cada ofensa tantas vezes quantas ela te for feita; ensinarás a teus irmãos esse esquecimento de si mesmo, que torna uma criatura invulnerável ao ataque, aos maus procedimentos e às injúrias; serás brando e humilde de coração, sem medir a tua mansuetude; farás, enfim, o que desejas que o Pai celestial por ti faça. Não está ele a te perdoar freqüentemente? Conta porventura as vezes que o seu perdão desce a te apagar as faltas?
Prestai, pois, ouvidos a essa resposta de Jesus e, como Pedro, aplicai-a a vós mesmos.
Perdoai, usai de indulgência, sede caridosos, generosos, pródigos até do vosso amor. Dai, que o Senhor vos restituirá; perdoai, que o Senhor vos perdoará; abaixai-vos, que o Senhor vos elevará; humilhai-vos, que o Senhor fará vos assenteis à sua direita.
Ide, meus bem-amados, estudai e comentai estas palavras que vos dirijo da parte d'Aquele que, do alto dos esplendores celestes, vos tem sempre sob as suas vistas e prossegue com amor na tarefa ingrata a que deu começo, faz dezoito séculos. Perdoai aos vossos irmãos, como precisais que se vos perdoe. Se seus atos pessoalmente vos prejudicaram, mais um motivo aí tendes para serdes indulgentes, porquanto o mérito do perdão é proporcionado à gravidade do mal. Nenhum merecimento teríeis em relevar os agravos dos vossos irmãos, desde que não passassem de simples arranhões.
Espíritas, jamais vos esqueçais de que, tanto por palavras, como por atos, o perdão das injúrias não deve ser um termo vão. Pois que vos dizeis espíritas, sede-o. Olvidai o mal que vos hajam feito e não penseis senão numa coisa: no bem que podeis fazer. Aquele que enveredou por esse caminho não tem que se afastar daí, ainda que por pensamento, uma vez que sois responsáveis pelos vossos pensamentos, os quais todos Deus conhece. Cuidai, portanto, de os expungir de todo sentimento de rancor. Deus sabe o que demora no fundo do coração de cada um de seus filhos. Feliz, pois, daquele que pode todas as noites adormecer, dizendo: Nada tenho contra o meu próximo. Simeão. (Bordéus, 1862.)

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Obediência e resignação



8. A doutrina de Jesus ensina, em todos os seus pontos, a obediência e a resignação, duas virtudes companheiras da doçura e muito ativas, se bem os homens erradamente as confundam com a negação do sentimento e da vontade. A obediência é o consentimento da razão; a resignação é o consentimento do coração, forças ativas ambas, porquanto carregam o fardo das provações que a revolta insensata deixa cair. O pusilânime não pode ser resignado, do mesmo modo que o orgulhoso e o egoísta não podem ser obedientes. Jesus foi a encarnação dessas virtudes que a antiguidade material desprezava. Ele veio no momento em que a sociedade romana perecia nos desfalecimentos da corrupção. Veio fazer que, no seio da Humanidade deprimida, brilhassem os triunfos do sacrifico e da renúncia carnal.
Cada época é marcada, assim, com o cunho da virtude ou do vício que a tem de salvar ou perder. A virtude da vossa geração é a atividade intelectual; seu vicio é a indiferença moral. Digo, apenas, atividade, porque o gênio se eleva de repente e descobre, por si só, horizontes que a multidão somente mais tarde verá, enquanto que a atividade é a reunião dos esforços de todos para atingir um fim menos brilhante, mas que prova a elevação intelectual de uma época. Submetei-vos à impulsão que vimos dar aos vossos espíritos; obedecei à grande lei do progresso, que é a palavra da vossa geração. Ai do espírito preguiçoso, ai daquele que cerra o seu entendimento! Ai dele! porquanto nós, que somos os guias da Humanidade em marcha, lhe aplicaremos o látego e lhe submeteremos a vontade rebelde, por meio da dupla ação do freio e da espora. Toda resistência orgulhosa terá de, cedo ou tarde, ser vencida. Bem-aventurados, no entanto, os que são brandos, pois prestarão dócil ouvido aos ensinos. - Lázaro. (Paris, 1863.)

domingo, 30 de outubro de 2011

O ódio



10. Amai-vos uns aos outros e sereis felizes. Tomai sobretudo a peito amar os que vos inspiram indiferença, ódio, ou desprezo. O Cristo, que deveis considerar modelo, deu-vos o exemplo desse devotamento, Missionário do amor, ele amou até dar o sangue e a vida por amor, Penoso vos é o sacrifício de amardes os que vos ultrajam e perseguem; mas, precisamente, esse sacrifício é que vos torna superiores a eles. Se os odiásseis, como vos odeiam, não valeríeis mais do que eles. Amá-los é a hóstia imácula que ofereceis a Deus na ara dos vossos corações, hóstia de agradável aroma e cujo perfume lhe sobe até o seio. Se bem a lei de amor mande que cada um ame indistintamente a todos os seus irmãos, ela não couraça o coração contra os maus procederes; esta é, ao contrário, a prova mais angustiosa, e eu o sei bem, porquanto, durante a minha última existência terrena, experimentei essa tortura. Mas Deus lá está e pune nesta vida e na outra os que violam a lei de amor. Não esqueçais, meus queridos filhos, que o amor aproxima de Deus a criatura e o ódio a distancia dele. - Fénelon, (Bordéus, 1861.)

sábado, 29 de outubro de 2011

Advento do Espírito de Verdade



5. Venho, como outrora aos transviados filhos de Israel, trazer-vos a verdade e dissipar as trevas. Escutai-me. O Espiritismo, como o fez antigamente a minha palavra, tem de lembrar aos incrédulos que acima deles reina a imutável verdade: o Deus bom, o Deus grande, que faz germinem as plantas e se levantem as ondas. Revelei a doutrina divinal.
Como um ceifeiro, reuni em feixes o bem esparso no seio da Humanidade e disse: “Vinde a mim, todos vós que sofreis."
Mas, ingratos, os homens afastaram-se do caminho reto e largo que conduz ao reino de meu Pai e enveredaram pelas ásperas sendas da impiedade. Meu Pai não quer aniquilar a raça humana; quer que, ajudando-vos uns aos outros, mortos e vivos, isto é, mortos segundo a carne, porquanto não existe a morte, vos socorrais mutuamente, e que se faça ouvir não mais a voz dos profetas e dos apóstolos, mas a dos que já não vivem na Terra, a clamar: Orai e crede! pois que a morte é a ressurreição, sendo a vida a prova buscada e durante a qual as virtudes que houverdes cultivado crescerão e se desenvolverão como o cedro.
Homens fracos, que compreendeis as trevas das vossas inteligências, não afasteis o facho que a clemência divina vos coloca nas mãos para vos clarear o caminho e reconduzir-vos, filhos perdidos, ao regaço de vosso Pai.
Sinto-me por demais tomado de compaixão pelas vossas misérias, pela vossa fraqueza imensa, para deixar de estender mão socorredora aos infelizes transviados que, vendo o céu, caem nos abismos do erro. Crede, amai, meditai sobre as coisas que vos são reveladas; não mistureis o joio com a boa semente, as utopias com as verdades.
Espíritas! amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o segundo. No Cristianismo encontram-se todas as verdades; são de origem humana os erros que nele se enraizaram. Eis que do além-túmulo, que julgáveis o nada, vozes vos clamam: "Irmãos! nada perece. Jesus-Cristo é o vencedor do mal, sede os vencedores da impiedade." - O Espírito de Verdade. (Paris, 1860.)

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Desprendimento dos bens terrenos



14. Venho, meus irmãos, meus amigos, trazer-vos o meu óbolo, a fim de vos ajudar a avançar, desassombradamente, pela senda do aperfeiçoamento em que entrastes. Nós nos devemos uns aos outros; somente pela união sincera e fraternal entre os Espíritos e os encarnados será possível a regeneração.
O amor aos bens terrenos constitui um dos mais fortes óbices ao vosso adiantamento moral e espiritual. Pelo apego à posse de tais bens, destruís as vossas faculdades de amar, com as aplicardes todas às coisas materiais. Sede sinceros: proporciona a riqueza uma felicidade sem mescla? Quando tendes cheios os cofres, não há sempre um vazio no vosso coração? No fundo dessa cesta de flores não há sempre oculto um réptil? Compreendo a satisfação, bem justa, aliás, que experimenta o homem que, por meio de trabalho honrado e assíduo, ganhou uma fortuna; mas, dessa satisfação, muito natural e que Deus aprova, a um apego que absorve todos os outros sentimentos e paralisa os impulsos do coração vai grande distância, tão grande quanto a que separa da prodigalidade exagerada a sórdida avareza, dois vícios entre os quais colocou Deus a caridade, santa e salutar virtude que ensina o rico a dar sem ostentação, para que o pobre receba sem baixeza. 
Quer a fortuna vos tenha vindo da vossa família, quer a tenhais ganho com o vosso trabalho, há uma coisa que não deveis esquecer nunca: é que tudo promana de Deus, tudo retorna a Deus. Nada vos pertence na Terra, nem sequer o vosso pobre corpo: a morte vos despoja dele, como de todos os bens materiais. Sois depositários e não proprietários, não vos iludais. Deus vo-los emprestou, tendes de lhos restituir; e ele empresta sob a condição de que o supérfluo, pelo menos, caiba aos que carecem do necessário.
Um dos vossos amigos vos empresta certa quantia. Por pouco honesto que sejais, fazeis questão de lha restituirdes escrupulosamente e lhe ficais agradecido. Pois bem: essa a posição de todo homem rico. Deus é o amigo celestial, que lhe emprestou a riqueza, não querendo para si mais do que o amor e o reconhecimento do rico. Exige deste, porém, que a seu turno dê aos pobres, que são, tanto quanto ele, seus filhos.
Ardente e desvairada cobiça despertam nos vossos corações os bens que Deus vos confiou. Já pensastes, quando vos deixais apegar imoderadamente a uma riqueza perecível e passageira como vós mesmos, que um dia tereis de prestar contas ao Senhor daquilo que vos veio d'Ele? Olvidais que, pela riqueza, vos revestistes do caráter sagrado de ministros da caridade na Terra, para serdes da aludida riqueza dispensadores inteligentes? Portanto, quando somente em vosso proveito usais do que se vos confiou, que sois, senão depositários infiéis? Que resulta desse esquecimento voluntário dos vossos deveres? A morte, inflexível, inexorável, rasga o véu sob que vos ocultáveis e vos força a prestar contas ao Amigo que vos favorecera e que nesse momento enverga diante de vós a toga de juiz.
Em vão procurais na Terra iludir-vos, colorindo com o nome de virtude o que as mais das vezes não passa de egoísmo. Em vão chamais economia e previdência ao que apenas é cupidez e avareza, ou generosidade ao que não é senão prodigalidade em proveito vosso. Um pai de família, por exemplo, se abstém de praticar a caridade, economizará, amontoará ouro, para, diz ele, deixar aos filhos a maior soma possível de bens e evitar que caiam na miséria. E muito justo e paternal, convenho, e ninguém pode censurar. Mas será sempre esse o único móvel a que ele obedece? Não será muitas vezes um compromisso com a sua consciência, para justificar, aos seus próprios olhos e aos olhos do mundo, seu apego pessoal aos bens terrenais? Admitamos, no entanto, seja o amor paternal o único móvel que o guie. Será isso motivo para que esqueça seus irmãos perante Deus? Quando já ele tem o supérfluo, deixará na miséria os filhos, por lhes ficar um pouco menos desse supérfluo? Não será, antes, dar-lhes uma lição de egoísmo e endurecer-lhes os corações? Não será estiolar neles o amor ao próximo? Pais e mães, laborais em grande erro, se credes que desse modo granjeais maior afeição dos vossos filhos. Ensinando-lhes a ser egoístas para com os outros, ensinais-lhes a sê-lo para com vos mesmos.
A um homem que muito haja trabalhado, e que com o suor de seu rosto acumulou bens, é comum ouvirdes dizer que, quando o dinheiro é ganho, melhor se lhe conhece o valor.
Nada mais exato. Pois bem! Pratique a caridade, dentro das suas possibilidades, esse homem que declara conhecer todo o valor do dinheiro, e maior será o seu merecimento, do que o daquele que, nascido na abundância, ignora as rudes fadigas do trabalho. Mas, também, se esse homem, que se recorda dos seus penares, dos seus esforços, for egoísta, impiedoso para com os pobres, bem mais culpado se tornará do que o outro, pois, quanto melhor cada um conhece por si mesmo as dores ocultas da miséria, tanto mais propenso deve sentir-se em aliviá-las nos outros.
Infelizmente, sempre há no homem que possui bens de fortuna um sentimento tão forte quanto o apego aos mesmos bens: é o orgulho. Não raro, vê-se o arrivista atordoar, com a narrativa de seus trabalhos e de suas habilidades, o desgraçado que lhe pede assistência, em vez de acudi-lo, e acabar dizendo: "Faça o que eu fiz." Segundo o seu modo de ver, a bondade de Deus não entra por coisa alguma na obtenção da riqueza que conseguiu acumular; pertence-lhe a ele, exclusivamente, o mérito de a possuir. O orgulho lhe põe sobre os olhos uma venda e lhe tapa os ouvidos. Apesar de toda a sua inteligência e de toda a sua aptidão, não compreende que, com uma só palavra, Deus o pode lançar por terra. 
Esbanjar a riqueza não é demonstrar desprendimento dos bens terrenos: é descaso e indiferença. Depositário desses bens, não tem o homem o direito de os dilapidar, como não tem o de os confiscar em seu proveito. Prodigalidade não é generosidade: é, freqüentemente, uma modalidade do egoísmo. Um, que despenda a mancheias o ouro de que disponha, para satisfazer a uma fantasia, talvez não dê um centavo para prestar um serviço. O desapego aos bens terrenos consiste em apreciá-los no seu justo valor, em saber servir-se deles em benefício dos outros e não apenas em benefício próprio, em não sacrificar por eles os interesses da vida futura, em perdê-los sem murmurar, caso apraza a Deus retirá-los. Se, por efeito de imprevistos reveses, vos tornardes qual Job, dizei, como ele: "Senhor, tu mos havias dado e mos tiraste. Faça-se a tua vontade." Eis ai o verdadeiro desprendimento. Sede, antes de tudo, submissos; confiai n'Aquele que, tendo-vos dado e tirado, pode novamente restituir-vos o que vos tirou. Resisti animosos ao abatimento, ao desespero, que vos paralisam as forças. Quando Deus vos desferir um golpe, não esqueçais nunca que, ao lado da mais rude prova, coloca sempre uma consolação. Ponderai, sobretudo, que há bens infinitamente mais preciosos do que os da Terra e essa idéia vos ajudará a desprender-vos destes últimos. O pouco apreço que se ligue a uma coisa faz que menos sensível seja a sua perda. O homem que se aferra aos bens terrenos é como a criança que somente vê o momento que passa. O que deles se desprende é como o adulto que vê as coisas mais importantes, por compreender estas proféticas palavras do Salvador: "O meu reino não é deste mundo." 
A ninguém ordena o Senhor que se despoje do que possua, condenando-se a uma voluntária mendicidade, porquanto o que tal fizesse tornar-se-ia em carga para a sociedade. Proceder assim fora compreender mal o desprendimento dos bens terrenos. Fora egoísmo de outro gênero, porque seria o indivíduo eximir-se da responsabilidade que a riqueza faz pesar sobre aquele que a possui. Deus a concede a quem bem lhe parece, a fim de que a administre em proveito de todos. O rico tem, pois, uma missão, que ele pode embelezar e tornar proveitosa a si mesmo. Rejeitar a riqueza, quando Deus a outorga, é renunciar aos benefícios do bem que se pode fazer, gerindo-a com critério. Sabendo prescindir dela quando não a tem, sabendo empregá-la utilmente quando a possui, sabendo sacrificá-la quando necessário, procede a criatura de acordo com os desígnios do Senhor. Diga, pois, aquele a cujas mãos venha o que no mundo se chama uma boa fortuna: Meu Deus, tu me destinaste um novo encargo; dá-me a força de desempenhá-lo segundo a tua santa vontade.
Aí tendes, meus amigos, o que eu vos queria ensinar acerca do desprendimento dos bens terrenos. Resumirei o que expus, dizendo: Sabei contentar-vos com pouco. Se sois pobres, não invejeis os ricos, porquanto a riqueza não é necessária à felicidade. Se sois ricos, não esqueçais que os bens de que dispondes apenas vos estão confiados e que tendes de justificar o emprego que lhes derdes, como se prestásseis contas de uma tutela. Não sejais depositário infiel, utilizando-os unicamente em satisfação do vosso orgulho e da vossa sensualidade. Não vos julgueis com o direito de dispor em vosso exclusivo
proveito daquilo que recebestes, não por doação, mas simplesmente como empréstimo. Se não sabeis restituir, não tendes o direito de pedir, e lembrai-vos de que aquele que dá aos pobres, salda a dívida que contraiu com Deus. - Lacordaire. (Constantina, 1863.)

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Os tormentos voluntários



23. Vive o homem incessantemente em busca da felicidade, que também incessantemente lhe foge, porque felicidade sem mescla não se encontra na Terra. Entretanto, mau grado às vicissitudes que formam o cortejo inevitável da vida terrena, poderia ele, pelo menos, gozar de relativa felicidade, se não a procurasse nas coisas perecíveis e sujeitas às mesmas vicissitudes, isto é, nos gozos materiais em vez de a procurar nos gozos da alma, que são um prelibar dos gozos celestes, imperecíveis; em vez de procurar a paz do coração, única felicidade real neste mundo, ele se mostra ávido de tudo o que o agitará e turbará, e, coisa singular! o homem, como que de intento, cria para si tormentos que está nas suas mãos evitar.
Haverá maiores do que os que derivam da inveja e do ciúme? Para o invejoso e o ciumento, não há repouso; estão perpetuamente febricitantes. O que não têm e os outros possuem lhes causa insônias. Dão-lhes vertigem os êxitos de seus rivais; toda a emulação, para eles, se resume em eclipsar os que lhes estão próximos, toda a alegria em excitar, nos que se lhes assemelham pela insensatez, a raiva do ciúme que os devora. Pobres insensatos, com efeito, que não imaginam sequer que, amanhã talvez, terão de largar todas essas frioleiras cuja cobiça lhes envenena a vida! Não é a eles, decerto, que se aplicam estas palavras: "Bem-aventurados os aflitos, pois que serão consolados", visto que as suas preocupações não são aquelas que têm no céu as compensações merecidas.
Que de tormentos, ao contrário, se poupa aquele que sabe contentar-se com o que tem, que nota sem inveja o que não possui, que não procura parecer mais do que é. Esse é sempre rico, porquanto, se olha para baixo de si e não para, cima, vê sempre criaturas que têm menos do que ele. E calmo, porque não cria para si necessidades quiméricas. E não será uma felicidade a calma, em meio das tempestades da vida? - Fénelon. (Lião, 1860.)

sábado, 22 de outubro de 2011

Espíritos eternos, estamos hoje no ponto exato da evolução para o qual nos preparamos, com os recursos mais adequados à solução de nossos problemas e tarefas, segundo os compromissos que abraçamos, seja no campo do progresso necessário ou na esfera da provação retificadora.

Achamo-nos com os melhores familiares e com os melhores companheiros que a lei do merecimento nos atribui.
A vista disso, permaneçamos convencidos de que a base de nossa tranqüilidade reside na integridade da consciência; compreendamos que todas as afeições-problemas em nossa trilha de agora constituem débitos de existências passadas que nos compete ressarcir e que todas as facilidades que já nos enriquecem a estrada são instrumentos que o Senhor nos empresta, a fim de utilizarmos a vontade própria, na construção de mais ampla felicidade porvindoura e entendamos que a vida nos devolve aquilo que lhe damos.Na posse de semelhantes instruções, valorizemos o tempo, para que o tempo nos valorize e permaneçamos em equilíbrio sem afetar aquilo que não somos, em matéria de elevação, conquanto reconhecendo a necessidade de aperfeiçoar-nos sempre.Se erramos, estejamos decididos à corrigenda, agindo com sinceridade e trabalhando fielmente para isso.Você e nós, estejamos certos, diante da Providência Divina, que possuímos infinitas possibilidades de reajuste, aprimoramento, ação e ascensão e que depende tão-somente de nós melhorar ou agravar, iluminar ou obscurecer as nossas situações e caminhos.(André Luiz)

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A paciência



7. A dor é uma bênção que Deus envia a seus eleitos; não vos aflijais, pois, quando sofrerdes; antes, bendizei
de Deus onipotente que, pela dor, neste mundo, vos marcou para a glória no céu.
Sede pacientes. A paciência também é uma caridade e deveis praticar a lei de caridade ensinada pelo Cristo, enviado de Deus. A caridade que consiste na esmola dada aos pobres é a mais fácil de todas. Outra há, porém, muito mais penosa e, conseguintemente, muito mais meritória: a de perdoarmos aos que Deus colocou em nosso caminho para serem instrumentos do nosso sofrer e para nos porem à prova a paciência.
A vida é difícil, bem o sei. Compõe-se de mil nadas, que são outras tantas picadas de alfinetes, mas que acabam por ferir. Se, porém, atentarmos nos deveres que nos são impostos, nas consolações e compensações que, por outro lado, recebemos, havemos de reconhecer que são as bênçãos muito mais numerosas do que as dores. O fardo parece menos pesado, quando se olha para o alto, do que quando se curva para a terra a fronte.
Coragem, amigos! Tendes no Cristo o vosso modelo. Mais sofreu ele do que qualquer de vós e nada tinha de que se penitenciar, ao passo que vós tendes de expiar o vosso passado e de vos fortalecer para o futuro. Sede, pois, pacientes, sede cristãos. Essa palavra resume tudo. - Um Espírito amigo. (Havre, 1862.)

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A lei de amor



8. O amor resume a doutrina de Jesus toda inteira, visto que esse é o sentimento por excelência, e os sentimentos são os instintos elevados à altura do progresso feito. Em sua origem, o homem só tem instintos; quando mais avançado e corrompido, só tem sensações; quando instruído e depurado, tem sentimentos. E o ponto delicado do sentimento é o amor, não o amor no sentido vulgar do termo, mas esse sol interior que condensa e reúne em seu ardente foco todas as aspirações e todas as revelações sobre-humanas. A lei de amor substitui a personalidade pela fusão dos seres; extingue as misérias sociais. Ditoso aquele que, ultrapassando a sua humanidade, ama com amplo amor os seus irmãos em sofrimento! ditoso aquele que ama, pois não conhece a miséria da alma, nem a do corpo. Tem ligeiros os pés e vive como que transportado, fora de si mesmo. Quando Jesus pronunciou a divina palavra - amor, os povos sobressaltaram-se e os mártires, ébrios de esperança, desceram ao circo.
O Espiritismo a seu turno vem pronunciar uma segunda palavra do alfabeto divino. Estai atentos, pois que essa palavra ergue a lápide dos túmulos vazios, e a reencarnação, triunfando da morte, revela às criaturas deslumbradas o seu patrimônio intelectual. Já não é ao suplício que ela conduz o homem: conduz à conquista do seu ser, elevado e transfigurado. O sangue resgatou o Espírito e o Espírito tem hoje que resgatar da matéria o homem.
Disse eu que em seus começos o homem só instintos possuía. Mais próximo, portanto, ainda se acha do ponto de partida, do que da meta, aquele em quem predominam os instintos. A fim de avançar para a meta, tem a criatura que vencer os instintos, em proveito dos sentimentos, isto é, que aperfeiçoar estes últimos, sufocando os germes latentes da matéria. 
Os instintos são a germinação e os embriões do sentimento; trazem consigo o progresso, como a glande encerra em si o carvalho, e os seres menos adiantados são os que, emergindo pouco a pouco de suas crisálidas, se conservam escravizados aos instintos. O Espírito precisa ser cultivado, como um campo. Toda a riqueza futura depende do labor atual, que vos granjeará muito mais do que bens terrenos: a elevação gloriosa. E então que, compreendendo a lei de amor que liga todos os seres, buscareis nela os gozos suavíssimos da alma, prelúdios das alegrias celestes. - Lázaro. (Paris, 1862.)

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Simplicidade e pureza de coração



1. Bem-aventurados os que têm puro o coração, porquanto verão a Deus. (S. Mateus, cap. V, v. 8.)

2. Apresentaram-lhe então algumas crianças, a fim de que ele as tocasse, e, como seus discípulos afastassem com palavras ásperas os que lhas apresentavam, Jesus, vendo isso, zangou-se e lhes disse: “Deixai que venham a mim as criancinhas e não as impeçais, porquanto o reino dos céus é para os que se lhes assemelham. - Digo-vos, em verdade, que aquele que não receber o reino de Deus como uma criança, nele não entrará.” - E, depois de as abraçar, abençoou-as, impondo-lhes as mãos. (S. MARCOS, cap. X, vv. 13 a 16.)

3. A pureza do coração é inseparável da simplicidade e da humildade. Exclui toda idéia de egoísmo e de orgulho. Por isso é que Jesus toma a infância como emblema dessa pureza, do mesmo modo que a tomou como o da humildade.
Poderia parecer menos justa essa comparação, considerando-se que o Espírito da criança pode ser muito antigo e que traz, renascendo para a vida corporal, as imperfeições de que se não tenha despojado em suas precedentes existências. Só um Espírito que houvesse chegado à perfeição nos poderia oferecer o tipo da verdadeira pureza. E exata a comparação, porém, do ponto de vista da vida presente, porquanto a criancinha, não havendo podido ainda manifestar nenhuma tendência perversa, nos apresenta a imagem da inocência e da candura. Daí o não dizer Jesus, de modo absoluto, que o reino dos céus é para elas, mas para os que se lhes assemelhem.
4. Pois que o Espírito da criança já viveu, por que não se mostra, desde o nascimento, tal qual é? Tudo é sábio nas obras de Deus. A criança necessita de cuidados especiais, que somente a ternura materna lhe pode dispensar, ternura que se acresce da fraqueza e da ingenuidade da criança. Para uma mãe, seu filho é sempre um anjo e assim era preciso que fosse, para lhe cativar a solicitude. Ela não houvera podido ter-lhe o mesmo devotamento, se, em vez da graça ingênua, deparasse nele, sob os traços infantis, um caráter viril e as idéias de um adulto e, ainda menos, se lhe viesse a conhecer o passado.
Aliás, faz-se necessário que a atividade do princípio inteligente seja proporcionada à fraqueza do corpo, que não poderia resistir a uma atividade muito grande do Espírito, como se verifica nos indivíduos grandemente precoces. Essa a razão por que, ao aproximar-se-lhe a encarnação, o Espírito entra em perturbação e perde pouco a pouco a consciência de si mesmo, ficando, por certo tempo, numa espécie de sono, durante o qual todas as suas faculdades permanecem em estado latente. E necessário esse estado de transição para que o Espírito tenha um novo ponto de partida e para que esqueça, em sua nova existência, tudo aquilo que a possa entravar. Sobre ele, no entanto, reage o passado. Renasce para a vida maior, mais forte, moral e intelectualmente, sustentado e secundado pela intuição que conserva da experiência adquirida.
A partir do nascimento, suas idéias tomam gradualmente impulso, à medida que os órgãos se desenvolvem, pelo que se pode dizer que, no curso dos primeiros anos, o Espírito é verdadeiramente criança, por se acharem ainda adormecidas as idéias que lhe formam o fundo do caráter. Durante o tempo em que seus instintos se conservam amodorrados, ele é mais maleável e, por isso mesmo, mais acessível às impressões capazes de lhe modificarem a natureza e de fazê-lo progredir, o que toma mais fácil a tarefa que incumbe aos pais.
O Espírito, pois, enverga temporariamente a túnica da inocência e, assim, Jesus está com a verdade, quando, sem embargo da anterioridade da alma, toma a criança por símbolo da pureza e da simplicidade.